Mais um dia à espera na paragem. Mais um final de tarde perdido entre casa e o trabalho no autocarro. Mais uma série de vidas com que me cruzo e de que nada sei, nada saberei e contudo, nada me esforcei para saber. Vejo o autocarro aproximar-se ao longe, já vem cheio lá de baixo. Três números bem grandes enfeitam a sua frente, 758. “Ainda há muita paragem a percorrer até chegar ao destino.”, pensei. Com o aproximar do mesmo é fácil perceber que não há muito espaço para todos os que o esperam. Iniciam-se os empurrões, as palavras, os gestos, os pensamentos, os sonhos e acaba-se a humanidade. Aqueles que conseguem entrar, tal como eu, têm pela sua frente uma outra batalha. Dentro do autocarro começa-se a sentir o espaço a reduzir, as pessoas cada vez mais próximas, cada vez menos ar, cada vez mais apertado, cada vez menos vida. Vejo, nos lugares do fundo sentada num banco uma rapariga de fones nos ouvidos, “Quem me dera ser eu”, pensei enquanto sentia a pessoa do lado a quase colar o seu corpo no meu. “Só mais um bocadinho”, “É só um jeitinho” ouve-se sair da boca daqueles que, por pouca sorte, ainda têm um pé de fora. Mas que bocadinho é possível dar mais? Alguns já vão quase ao colo do motorista, outros já treparam e se sentaram no lugar das malas. Todos sabemos que vem aí o empurrão final e a porta lá se fecha. Arrancou, ninguém se moveu, também seria impossível. Aquele autocarro parece uma lata de sardinhas, faz-se jus à cultura barata da cidade onde habitamos.
Segue caminho, aquela lata de quatro rodas por estradas atoladas de carros, por ruas sem alma viva. Cheia de almas encarceradas numa vida sem vida, cheia de suspiros de lamentação, inundada pelo cheiro a pessoas, a cansaço, a desilusão, a desespero e tristeza. À medida que avança pelas ruas da cidade que tão bem conhece vai ficando cada vez mais vazia. Um vazio interior, uma vida cada vez mais desperdiçada, cada vez mais espaço existe entre aqueles que ainda resistem. Começo a ouvir uma conversa entre duas senhoras. Nada de novo. Se não é o governo, é o tempo de espera, o futebol, o que a vizinha Maria fez à Elvira, o preço do gasóleo, as doenças, como a geração actual está perdida e ligada às máquinas e, para terminar, o tema que mais aprecio, o tempo. “Dizem que vai chover”, “Hoje está sol, mas quando me alevantei estava de chuva” e por aí seguem outras indicações meteorológicas banais de quem olhou para o vidro e viu como estava o dia. Faltam duas paragens para acabar a carreira, é aqui que estas duas senhoras descem. É aqui que um silêncio sepulcral invade o autocarro. A quantidade de almas que ali resiste pode ser contada pelos dedos das mãos. Os olhares cruzam-se por entre pequenos gestos de cansaço e sem vida. “Estou quase em casa” é o pensamento que passa a todos pela cabeça. Ao fundo já consigo ver a última paragem. Já existe uma pequena esperança em cada um de nós. Um telemóvel toca todavia, ninguém o atende. Ninguém sabe de quem é. Poderia ser de qualquer um de nós. E, subitamente, parou. A porta abriu-se, era altura de sair. Olhei de novo para aquele pequeno espaço onde me tinha cruzado com tantas vidas, nenhuma se tinha cruzado com a minha na realidade. Parecia gigante agora, há uns minutos atrás era tão pequeno. Estava vazio, não era o único assim. Passei pelo condutor e disse “Boa Noite” com uma voz de quem a fadiga e a fome já estava a levar a melhor. Atrás de mim ouvi uma voz alegre dizer-me “Boa Noite, amanhã à mesma hora, certo?”. Olhei para trás e sorri, talvez não estivesse tão vazio assim aquele autocarro. Talvez sempre houvesse vida ali. Talvez alguma vida se tinha cruzado com a minha.
A pergunta que mais vezes me fizeram nos últimos tempos quando falo do InterRail foi “Não tens/tiveste medo?”. O facto de ter viajado sozinho pela europa, sem um rumo propriamente traçado, sem nada planeado, apenas eu, o Sapo e uma mochila às costas espantou muitos dos que se cruzaram no meu caminho, tanto em viagem, como já em Portugal. Viajar sozinhos faz-nos entender muita coisa sobre nós próprio, o mundo e as pessoas que nele habitam. E por isso, esta publicação vai ser dedicada às coisas que aprendi nesta minha aventura europeia.
Quase nunca estás sozinho
Começando por desconstruir o mito número um de viajar sozinho, a verdade é que só estás sozinho quando realmente o desejas. Existe centenas de pessoas, para não dizer milhares, a viajar sozinhos e no mesmo sitio que tu. Quer sejam turistas ou locais, há sempre alguém com quem vais meter conversa e se vai tornar teu amigo durante algumas horas ou dias. Por vezes, acabas mesmo por conhecer uma cidade ou apenas beber uma cerveja num parque algures na companhia de um estranho, que deixou de ser assim tão estranho. Tive muitos momentos de solidão na nesta minha viagem, principalmente na parte das viagens de comboio por incrível que pareça contudo, guardo recordações de pessoas dos quatro cantos da europa e do mundo. Desde duas irmãs americanas, a um neo-zelândes, passando por coreanos, japoneses, tailandeses, indianos, canadianos, polacos, franceses, belgas, húngaros, checos, alemães, espanhóis e mexicanos. Não foi uma viagem pela Europa, foi um pouco pelo mundo também.
Não há zona de conforto
A ideia de zona de conforto que temos no nosso cantinho sossegados deixa de existir. Na realidade, a nossa zona de conforto torna-se tão grande que não percebemos que esta já não existe. Ao viajar sozinhos apercebemo-nos que somos capazes de fazer mais do que aquilo que realmente achávamos, principalmente se não levarmos nada programado. Saber que não há “ninguém” que te possa ajudar porque estás sozinho, torna-te mais responsável, atento e perspicaz. Gerires o orçamento da viagem, marcar dormidas, saber onde tens de ir, acabam por ser tarefas que te ensinam pequenos truques para a vida.
Afinal ainda há fé na humanidade
Muitas vezes achamos que o mundo está perdido, que apenas existem pessoas más e terríveis. E por vezes a vida encarrega-se de nos dar uma “lambada” e ensinar-nos que não é bem assim. É fácil encontrar pessoas que te queiram ajudar quando estás sozinho. É óbvio que algumas podem não ter as melhores intenções contudo, tens de aprender a perceber se podes confiar nelas ou não. No caminho para Cracóvia conheci um rapaz de Cracóvia que me levou da estação ao hostel onde iria ficar. Quanddo no fim queria pagar-lhe alguma coisa, tipo um café ou assim, apenas me respondeu “Não é preciso, apenas quero que as pessoas tenham uma boa ideia dos polacos”. Por vezes apenas temos de dar uma chance para o mundo nos surpreender.
Segue o teu instinto
Não planeies, não reserves com meses de antecedência, não entres em pânico, simplesmente liga o “descomplicometro” e aproveita. Se aquele bar não parece seguro, não vás. Se a achas a rua demasiado escura, procura outra. Aquela pessoa não parece de confiança, encontra outro alguém. Por vezes o instinto é o nosso melhor amigo.
Vai onde queres e não olhes para onde não queres
Uma das coisas que adorei nesta viagem foi o facto de ter o poder de decidir o que quero fazer. Estar apenas dependente de nós e dos nossos gostos torna a viagem muito mais interessante. Ninguém se vai queixar se quiseres ficar duas horas a olhar para um quadro num museu, nem se quiseres ficar sentado a ver o pôr-do-sol ou mesmo se quiseres estar um final de tarde num qualquer parque de uma cidade, deitado na relva a ler um livro. O tempo é teu amigo e tu és dono dele. Faz aquilo que mais te dá prazer e aproveita cada segundo.
Liberdade
Muitos pensamos que vivemos uma vida livre mas, quando olhamos à nossa volta, percebemos que na realidade vivemos aquilo que esperam de nós. Viajar sozinho vai relembrar-te que tu tens na tua mão os caminhos que queres seguir. Ninguém pode decidir por ti e a essa prisão de expectativas em que vives tem uma chave, apenas tens de olhar para o teu próprio bolso e abrir a porta.
Age como um local
A verdade é que as pessoas só vão saber que és um turista se tu quiseres. Este foi um conselho que duas amigas americanas que conheci em Paris me deram. Não estás num grupo com guia, não precisas de andar sempre de mapa em punho, na realidade tens tudo para ser mais um na multidão. Não te atrapalhes, confia em ti, as pessoas só vão perceber quando tu falares inglês em vez da língua local. Em quase todos os países por onde passei tive esta experiencia e acreditem que nos torna mais felizes.
Simplesmente aproveita
Podes ser quem tu quiseres durante a viajem, ninguém que te importe te poderá julgar. Aproveita cada segundo, cada sorriso, cada paisagem, cada rio, cada palácio, cada museu, cada pessoa que se cruza contigo, cada vez que te perdes numa cidade, cada beijo, cada noite e cada dia. Simplesmente aproveita-te. Aproveita para te conhecer e para perceberes o teu lugar no mundo. No fim, mesmo de depois de queres desistir ao 3º dia ou de te teres sentido sozinho um milhão de vezes, vais querer repetir a experiência que a solidão te trouxe. Vais querer sair à rua, numa cidade completamente estranha, com os fones nos ouvidos a ouvir aquela música que é tua naquele momento e vais largar um sorriso sem te aperceberes. Porque na realidade, estás a sentir que a vida finalmente te está a dar um verdadeiro momento só teu. Vais te sentir, (e desculpem a quote), infinito.
Os dias de turista começaram! Toronto é uma cidade cheia de sítios para visitar e, depois de uma semana de descanso, lá pus a mala às costas e a máquina fotográfica na mão e fui “turistar” um pouco a cidade. Claro que não fui sozinho, o meu companheiro de viagem SAPO tem sido a minha maior companhia nos últimos tempos.
Ripley’s Aquarium of Canada
O Ripley’s foi o meu primeiro destino na cidade de Toronto. Sou um apaixonado por animais, mais ainda pela vida marinha e, por esse motivo, não podia deixar passar mais um aquário no meu currículo. Este aquário, que abriu portas há cerca de 3 anos, apresenta-nos um pouco de todos os animais que existem não só em águas canadianas, como um pouco por todo o mundo. Dividido em 8 partes com temas diferentes, existem dois que chamam à atenção de qualquer visitante deste aquário, o The Dangerous Lagoon e The Planet Jellies. No The Dangerous Lagoon os visitantes são convidado a entrar num túnel subaquático com uma passadeira rolante de onde podem observar diversas espécies dos famosos tubarões. Existem mesmo avisos para que as pessoas façam sharkselfies e as partilhem com os amigos. Por outro lado, o The Planet Jellies traz até nós um aquário que vai alternando a sua cor de fundo com 5 espécies diferentes de medusas. Este efeito de alternância de cores faz com que as medusas se tornem animais ainda mais mágicos, interessantes e misteriosos.
The CN Tower
A melhor vista aérea que a cidade nos pode dar de si mesma. A verdade é mesmo esta, com 533 metros de altura e um restaurante com uma vista de 360º a 350 metros de altura no seu interior, fazem deste símbolo icónico de Toronto uma das melhores maneiras de observar a cidade, um pouco dos seus arredores e o lago Ontário. Tive o enorme prazer de jantar no restaurante que esta torre alberga e recomendo a todos que tenham oportunidade que o façam.
Podemos dizer que, literalmente, este restaurante não está quieto. Ele roda. À medida que se pode disfrutar de um ótimo jantar pode-se desfrutar de uma vista ainda melhor. O nome 360º vem desse mesmo facto, são 360º de contemplação para uma das cidades mais verde e mais bonita que já visitei. É preciso cerca de 1 minuto para ir da base da torre até ao restaurante e este demora cerca de 72 minutos a dar uma volta completa. É necessário reservar mesa online para que possa desfrutar de uma maravilhosa refeição e vista neste local.
Butterfly Conservatory
Com cerca de 2000 borboletas, de 45 espécies diferentes, a voar livremente numa gaiola gigante que mais nos parece uma floresta tropical é assim que Butterfly Conservatory se apresenta. Um local mágico, cheio de vida e de cor, em que, em qualquer momento, nos pode poisar uma magnífica borboleta na roupa, mala e, quem sabe, na cabeça. Um local peculiar, contudo muito interessante devido à variedade e quantidade de borboletas que nos apresenta. O próprio do meu companheiro de viagem decidiu fazer algumas amigas enquanto andámos por lá perdidos.
O Butterfly Conservatory faz parte do Niagara Parks que se encontra a cerca de 1 hora e 30 minutos de viagem de Toronto.
Niagara Falls
As cataratas que sempre sonhei visitar e finalmente isso aconteceu. Não vou mentir, a ideia que tinha é muito diferente da realidade. Não existe uma, mas sim duas quedas de água, a American Fall e a Canadian Fall. Desculpem-me os americanos, mas a que se encontra do lado canadiano é sem dúvida muito mais bonita. Na realidade, para poder apreciar ambas as cataratas a melhor maneira é fazê-lo do lado canadiano. É um local mágico onde o rio Niagara cai livremente por uma altura de 51 metros e transforma-se na fronteira entre dois países, USA e Canadá. Na verdade, os Estados Unidos são já ali, à distância de uma ponte. Existe um constante queda de “chuva” e é possível aproximar-se das cataratas através de cruzeiros que são realizados no rio.
O som que é produzido naquele local é fascinante, são milhares de litros de água a cair ao mesmo tempo. Um arco-íris sempre no ar, devido à humidade existente, torna o local ainda mais mágico e relaxante.
A poucos quilómetros deste local, existe uma pequena vila chamada Niagara-on-the-lake onde se podem ver as típicas casas destas bandas, bem como a zona de comércio da cidade mantêm características do início do século passado.
Escrevo-te, hoje, para te dizer que não quero mais falar. Não sei se reparaste mas nem tudo está como era. Já, alguma vez, cheiraste a noite? Eu já. A mim, a noite, cheira-me a um misto de tristeza, melancolia e mistério. Há noites que não cheiram a nada, pois nada há a cheirar.
Alguma vez ouviste a noite? Quando a noite cai o som que perdura nos meus ouvidos é o de um grilo a fazer "cri cri", a brisa a passar nos campos suavemente e o som das folhas das árvores com o correr da brisa. Por vezes, também, se ouve o silêncio e o barulho das luzes das cidades à distância. Como é bom ouvir o silêncio da noite.
Alguma vez sentiste a noite? Eu não. Não sei o que é sentir a noite. Gosto apenas de a cheirar e ouvir. Era tão absurdo sentir algo que não se pode sentir. Pois, afinal, o que é a noite?
About me
Loís Carvalho, 21 anos, Mundo. Existe um sem fim de sítios onde ir, pessoas por conhecer, vidas para viver, sonhos para alcançar, mundos por descobrir.