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Um Absurdo Sem Fim

23
Fev17

758

Loís Carvalho

      

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          Mais um dia à espera na paragem. Mais um final de tarde perdido entre casa e o trabalho no autocarro. Mais uma série de vidas com que me cruzo e de que nada sei, nada saberei e contudo, nada me esforcei para saber. Vejo o autocarro aproximar-se ao longe, já vem cheio lá de baixo. Três números bem grandes enfeitam a sua frente, 758. “Ainda há muita paragem a percorrer até chegar ao destino.”, pensei. Com o aproximar do mesmo é fácil perceber que não há muito espaço para todos os que o esperam. Iniciam-se os empurrões, as palavras, os gestos, os pensamentos, os sonhos e acaba-se a humanidade. Aqueles que conseguem entrar, tal como eu, têm pela sua frente uma outra batalha. Dentro do autocarro começa-se a sentir o espaço a reduzir, as pessoas cada vez mais próximas, cada vez menos ar, cada vez mais apertado, cada vez menos vida. Vejo, nos lugares do fundo sentada num banco uma rapariga de fones nos ouvidos, “Quem me dera ser eu”, pensei enquanto sentia a pessoa do lado a quase colar o seu corpo no meu. “Só mais um bocadinho”, “É só um jeitinho” ouve-se sair da boca daqueles que, por pouca sorte, ainda têm um pé de fora. Mas que bocadinho é possível dar mais? Alguns já vão quase ao colo do motorista, outros já treparam e se sentaram no lugar das malas. Todos sabemos que vem aí o empurrão final e a porta lá se fecha. Arrancou, ninguém se moveu, também seria impossível. Aquele autocarro parece uma lata de sardinhas, faz-se jus à cultura barata da cidade onde habitamos.

        Segue caminho, aquela lata de quatro rodas por estradas atoladas de carros, por ruas sem alma viva. Cheia de almas encarceradas numa vida sem vida, cheia de suspiros de lamentação, inundada pelo cheiro a pessoas, a cansaço, a desilusão, a desespero e tristeza. À medida que avança pelas ruas da cidade que tão bem conhece vai ficando cada vez mais vazia. Um vazio interior, uma vida cada vez mais desperdiçada, cada vez mais espaço existe entre aqueles que ainda resistem. Começo a ouvir uma conversa entre duas senhoras. Nada de novo. Se não é o governo, é o tempo de espera, o futebol, o que a vizinha Maria fez à Elvira, o preço do gasóleo, as doenças, como a geração actual está perdida e ligada às máquinas e, para terminar, o tema que mais aprecio, o tempo. “Dizem que vai chover”, “Hoje está sol, mas quando me alevantei estava de chuva” e por aí seguem outras indicações meteorológicas banais de quem olhou para o vidro e viu como estava o dia. Faltam duas paragens para acabar a carreira, é aqui que estas duas senhoras descem. É aqui que um silêncio sepulcral invade o autocarro. A quantidade de almas que ali resiste pode ser contada pelos dedos das mãos. Os olhares cruzam-se por entre pequenos gestos de cansaço e sem vida. “Estou quase em casa” é o pensamento que passa a todos pela cabeça. Ao fundo já consigo ver a última paragem. Já existe uma pequena esperança em cada um de nós. Um telemóvel toca todavia, ninguém o atende. Ninguém sabe de quem é. Poderia ser de qualquer um de nós. E, subitamente, parou. A porta abriu-se, era altura de sair. Olhei de novo para aquele pequeno espaço onde me tinha cruzado com tantas vidas, nenhuma se tinha cruzado com a minha na realidade. Parecia gigante agora, há uns minutos atrás era tão pequeno. Estava vazio, não era o único assim. Passei pelo condutor e disse “Boa Noite” com uma voz de quem a fadiga e a fome já estava a levar a melhor. Atrás de mim ouvi uma voz alegre dizer-me “Boa Noite, amanhã à mesma hora, certo?”. Olhei para trás e sorri, talvez não estivesse tão vazio assim aquele autocarro. Talvez sempre houvesse vida ali. Talvez alguma vida se tinha cruzado com a minha.

25
Nov15

De Lisboa à Eslovénia, passando pela Irlanda

Loís Carvalho
Hey Pessoal,


    Se se estão a perguntar se eu fiz uma viagem pela Europa deixem de perguntar, pois, infelizmente, isso não aconteceu. Não é necessário sair de Lisboa para dar a volta ao mundo em 8 horas. A diversidade cultura da nossa capital tem progredindo exponencialmente, tanto devido aos imigrantes, como aos estudantes de Erasmus. 
     Mais uma vez, a história de hoje passou-se numa noite, não depois do trabalho, mas sim, numa noite de diversão. Pela primeira vez na vida saí à noite sozinho, coisa que não me arrependo nada de ter feito. Aliás, é uma ótima razão para tentar fazer novos amigos e não nos sentirmos tão sozinhos. Depois de uma visita rápida a alguns bares no Bairro Alto, como "A Capela", que, desde já, recomendo uma visita quando passarem por Lisboa, desci até ao Cais do Sodré. Aí, encontrei um Irish Pub com música ao vivo, o O'Gilins. O O'Gilins é um típico Irish Pub onde a maioria dos clientes são estrangeiros, apesar dos portugueses começarem a apreciar este tipo de bares. Ao entrarmos no Pub somos transportados para a Irlanda como que por magia de um "leipreachán", sem nunca sairmos do Cais do Sodré. Todas as sextas e sábados oferece-nos pequenos e incríveis concertos de música irlandesa. Entre música, conversas e gargalhadas passaram-se duas horas de bom ambiente e disposição. Um Pub com imensa personalidade, simpatia, boa música, imensos tipos de cerveja. Espero um dia voltar, mais cedo, para puder desfrutar de um jantar pois, este Pub é também conhecido pela sua comida, fiquei eu a saber naquela noite.
      Quando o concerto acabou no O'Gilins, decidi que já estava na hora de ir para casa, pois trabalhava no dia  a seguir. Como costume, lá fui eu apanhar o meu 202, desta vez ali mesmo no Cais. Desta vez, tive o prazer de conhecer não uma, mas três raparigas super simpáticas, a Sara, a Veronika e a Tamara. Vêm da Eslovénia e, tal como muitos outros jovens, estão em Lisboa devido ao programa ERASMUS. Todas eles estudam sociologia  e escolheram o nosso país por ser o único que aceitava as três na mesma faculdade. Perguntei o que estavam a achar de Lisboa, já que a escolha tinha sido por aqueles motivos e não pela cidade em si. Tal como muitos outros, responderam-me que era uma cidade maravilhosa, muito bonita e barata em comparação com outras capitais europeias. Confidenciaram-me  que, ao contrário do que ouvem sobre Portugal, as pessoas têm sido um bocado rudes com elas, tanto nas lojas como no metro. Claro que tentei desculpar todos esses meus compatriotas, é normal que, por vezes, nos transportes públicos as pessoas estejam de mau humor, quer seja de manhã porque cedo, quer seja ao fim do dia depois de um dia de trabalho. 
            Depois de mais uns minutos de conversa, e já dentro do autocarro, houve outro assunto que veio à baila na conversa. O patriotismo, o tradicionalismo e o saudosismo  português. Estas três raparigas da Eslovénia vêem os portugueses  como um povo bastante patriota e agarrado à sua língua. Por diversas vezes já ouviram comentários típicos de um qualquer português, "Estás em Portugal, falas Português". Têm, mesmo, um professor na faculdade que as obriga a assistir às aulas em português, Talvez tenha a esperança que aprendamos português em seis meses só a ouvi-lo falar, disseram enquanto soltavam um gargalhada. Quem sabe, talvez se vocês falarem em eslovaco para ele durante seis meses ele aprenda também, retorqui na brincadeira. 

Aqui fica um video de um dos melhores momentos da noite no O'Gillins, onde podem (tentar) ver as a animação, pessoas a dançar nas mesas e a cantar. Desculpem a má qualidade do video, mas foi o possível.
08
Nov15

Viagem de Autocarro: Tânia

Loís Carvalho



Hey Pessoal,

     Uma das coisas que mais gosto de viver em Lisboa é o facto de em "todos os cantos" conhecer alguém novo, ter um conversa de momento e despedir-me com um "até à próxima", pois não sabes se irás, algumas vez na vida, reencontrar essa pessoa. O autocarro que apanho todas as noites após o trabalho tem-me proporcionado momentos como esse já por diversas vezes. E, como conhecer pessoas se trata de uma parte muito importante deste meu ano, decidi que começarei a descrever essas pessoas e encontros para vocês.
      Neste domingo, no meu 202 da meia noite e meia, conheci a Tânia. Uma jovem arquiteta de Coimbra, que fez o estágio do seu curso cá no mês passado e por isso decidiu vir visitar os amigos. A conversa começou pelo simples facto de ela não saber se na paragem do Largo Camões parava o 202, pois tinha queria apanhar o autocarro. Disse-lhe que sim, mas que sendo sábado para domingo à noite o autocarro podia demorar, demora sempre nestes dias. Ela explico-me que tinha tentado apanhar o metro, mas que por meros instantes, o tinha perdido. O próximo apenas passaria daí a 12 minutos e que, apesar de ter pago a viagem do metro, decidiu sair e tentar apanhar o autocarro. Tivemos uma conversa de alguns minutos sobre o autocarro, o metro, os passes. Enfim, conversas de paragem de autocarro. Era já 00:50 quando o 202 da 00:30 apareceu. Entramos os dois e toda as pessoas que já desesperavam por ele. Acabamos por nos sentar um ao lado do outro e, na curto viagem entre o Largo Camões e Campolide, descobri que afinal não éramos assim tão estranhos um do outro. Vínhamos os dois da mesma zona, eu de Arganil e ela de Coimbra. Uma coincidência da vida bastante engraçada. Contei-lhe o porque de ser tão novo e estar a trabalhar, partilhamos algumas ideias sobre o ano de pausa, o facto de em Portugal sermos quase "obrigados" a terminar o secundário e a ingressar no ensino superior logo a seguir e como é difícil as pessoas aceitarem que queres parar um ano. Nisto perguntei-lhe o que é que ela estudava, ao que obtive a resposta de que tinha acabado o curso de Arquitetura em Setembro, Curso que tirou em Coimbra, onde sempre viveu e estudou. Constatamos o facto de que se acaba os cursos muito cedo na nossa vida, e que aos 23, idade média em Portugal em que acabas o curso já com o mestrado feito, não nos vemos a fazer aquilo que estudamos para o resto da vida. Uma verdade bastante real, por isso é que não tem mal nenhum parar um ano, perceber aquilo que se quer. Acabar o curso um ano mais velho que o normal não fará qualquer diferença a nível profissional, constatou a minha companheira de viagem.
        Estávamos a chegar ao destino da Tânia, para mim ainda nem a meio do caminho íamos. Despedimos-nos, agradecendo a companhia que tínhamos feito um ao outro. Ela desejou-me boa sorte, retorqui-lhe o mesmo. Tânia despediu-se com um " Até à próxima", ao qual respondi "Até à próxima, pois nunca sabemos quando nos vamos cruzar de novo". Ela saiu e eu segui viagem no meu 202 da 00:30 em mais um regresso a casa.

(Obrigado Tânia pela companhia e espero que não te importes por contar esta história. Se alguma vez leres isto, avisa)

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Loís Carvalho, 21 anos, Mundo. Existe um sem fim de sítios onde ir, pessoas por conhecer, vidas para viver, sonhos para alcançar, mundos por descobrir.

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